Conceição! Eu me lembro muito bem.

 Ontem eu estava zapeando pelo Facebook quando deparei no feed de notícias uma foto publicada com uma mensagem carinhosa de despedida para Conceição. 

Como nossa memória é incrível. Para mim, a memória é como um móvel cheio de gavetinhas que guardam nossas lembranças. Elas ficam lá guardadinhas, arrumadinhas. Como uma camiseta que acaba esquecida no fundo da gaveta. E às vezes sem esperarmos alguém abre uma dessas gavetinhas e espalham nossas memórias. 

E coisas que estavam guardadas lá no fundo bem no cantinho da gaveta aparecem como se tivessem acontecido naquele instante. Foi o que aconteceu comigo ontem quando vi a foto da Conceição. Minhas lembranças caíram da gaveta e se espalharam. E agora estou recolhendo-as. 

A última vez que vi a Conceição foi há alguns anos numa cidadezinha bucólica no interior do Rio de Janeiro. Nos encontramos no casamento da minha sobrinha. 

Como o casamento foi realizado num feriado prolongado aproveitamos para conhecer uma cidadezinha encantadora que ficava a alguns minutos da pousada em que ficamos hospedados: Conservatória. E foi nessa cidade meu último encontro com a Conceição. 

Almoçamos juntos, Conceição e o Fernando, meu marido e eu. Conversamos muito naquele almoço. Relembramos o passado. Afinal ela era amiga da minha irmã, me conheceu quando eu ainda tinha treze anos, e o seu marido havia sido meu professor de matemática, no colegial. Passamos uma tarde deliciosa conversando animadamente. 

Voltando à minha gaveta revirada. Ao mexer nessa gaveta eu peguei a memória do meu primeiro baile. Haveria um baile na cidade e eu queria muito ir. Infelizmente o marido da minha irmã não gostava muito deste tipo de eventos. Como eu tinha apenas quatorze anos, minha irmã não permitiu que eu fosse ao baile com minhas amigas. E a Conceição, com sua voz meiga, falou com minha irmã para não se preocupar, pois eu iria ao baile com ela, e ficaria na mesma mesa. Além disso, comprometeu-se em me levar para casa em segurança. Foi a Conceição quem me levou ao meu primeiro, segundo, terceiro... Nem sei quantos bailes ela me levou... 

Também me lembro dos almoços entre as famílias, churrascos, as festinhas de aniversários. 

Para a minha irmã, Conceição era uma amiga especial. Minha irmã já estava casada quando se mudou para a cidade onde Conceição morava. Mesmo assim, minha irmã continuou sua educação. E foi na escola que as duas estreitaram os laços de amizade. 

Uma amizade que durou até hoje. Acho que a amizade das duas deve passar dos quarenta anos ou quase. Elas se casaram, tiveram filhos, mas nunca, por motivo algum, diminuíram ou interromperam a amizade. Quando minha a irmã fazia aniversário a Conceição sempre aparecia com um bolo, um presente ou os dois. Ela nunca se esquecia. 

Nos aniversários, nós os irmãos costumamos nos telefonar. Particularmente eu sou uma péssima irmã, pois sempre esqueço e acabo ligando depois que passou a data do aniversário. E todas as vezes que eu ligava para minha irmã, ela dizia: 

 - Ah, não vai ter festa não, mas eu fiz um bolo e preparei alguns comes e bebes porque a Conceição nunca deixou de vir aqui em casa me cumprimentar. Logo, logo ela deve estar chegando. 

E foi assim. Ano após ano. 

Conceição era assim. Mulher de sorriso encantador. Mãe, esposa, amiga, companheira, professora, batalhadora, engajada em projetos beneficentes seja na APAE ou na igreja local. Sempre pronta a estender a mão e ajudar o próximo. Por muitos anos esteve à frente dos projetos da APAE de sua cidade, como diretora. E mesmo após a sua aposentadoria continuou engajada. O que hoje é moda nas empresas, para ela sempre foi um estilo de vida: voluntariado. 

E ainda assim tinha tempo para se dedicar aos amigos e a família. Nunca abandonou seus pais, ao contrário, cuidou com zelo e amor de seu pai até o final da vida. 

E mesmo doente, nunca perdeu o sorriso e a alegria. Ela teve leveza para vivenciar todos os momentos difíceis e alegres, e até curtir a vitória do timão. Sempre com seu sorriso gostoso e suave. 

Hoje a cidade Pérola amanheceu mais triste, sem cor, sem brilho. Ficou apenas um vazio imenso. Na cidade. Nos corações daqueles que a conheceram. E na vida de centenas de crianças e pais em que ajudou a superar dificuldades e deficiências. 

A cidade está de luto. Mesmo eu estando distante, em São Paulo, também amanheci com uma enorme tristeza em meu coração. 

Imagino o que minha irmã deve estar sentindo. Quantas histórias fizeram. Quantas memórias nas gavetas! Tenho certeza que para ela está sendo como perder uma irmã, pois os nossos irmãos de sangue não escolhemos. A Conceição era a sua irmã de coração, era sua amiga e companheira de uma vida inteira. Compartilharam alegrias e tristezas. 

Tenho certeza que Deus deve estar refestelado em uma poltrona escutando histórias contadas pela Conceição, permeadas por largos sorrisos que só ela sabia dar. 

Conceição deixa saudades e muitas histórias para serem lembradas. 
Conceição! Agora literalmente "Dos Anjos".

Conceição Assunção dos Anjos
17/07/1954 - 27/07/2012
RIP Rest in peace (Descanse em paz). 

Comentários

  1. Helo, meus parabéns pela pessoa linda que você é, que guarda em sua memória e até mesmo no coração lembranças carinhosas daqueles que conviveram com você, e neste dia, escolheu palavras doces para carinhosamente deixar uma homenagem à Conceição.

    Abraços

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