Personagens reais ou que saíram de algum livro?


Alguma vez você topou com uma pessoa e questionou se o que estava vendo era real ou se tinha acabado de sair das páginas de algum livro de contos ou ficção?
Eu confesso que já esbarrei com tipos que pareciam ter escorregado de alguma página de livro.  No post do dia 23 de julho eu apresentei o baixinho de bombachas coloridas. Agora apresento a pequena mulher que andava ao contrário.

Parte 2 - A mulher que andava ao contrário.

Maria era uma mulher diferente das que eu havia conhecido. Ela era desprovida de qualquer vaidade. Estava sempre metida num vestido de mangas curtas e decote em V. Nunca usava roupa florida ou estampada, sempre cores sólidas e sóbrias. Seus cabelos viviam envoltos num singelo lenço de cor escura. Nos pés sempre um par de chinelos de borracha ou alpargatas.  Era magra, pele curtida pelo sol e pela labuta. 

Acho que Maria não atingia um metro e meio. Ela andava pela cidade sempre acompanhada de um menino que aparentava uns nove ou dez anos. Ela carregava nas mãos uma sacola de ráfia trançada. E ele um embornal de saco alvejado cruzado ao tronco. Todas as semanas ela passava em frente à loja.

Creio que me esqueci de mencionar que meu cunhado construiu uma nova loja, bem maior que a primeira, acho que tinha umas cinco ou seis portas duplas. Era a maior loja da cidade, no gênero, e ficava numa esquina, na última quadra da avenida. Um dos pontos mais altos, como costumamos falar, “aonde o vento faz a curva”.

 No inverno não era fácil ficar naquela esquina. O vento gelado uivava em nossos ouvidos. A grama do jardim amanhecia branca. Para suportar o vento gelado era preciso fechar algumas portas da loja.

Certa vez o frio era tão intenso que minha irmã resolveu fazer uma fogueira dentro da loja. Arrumou uma lata, encheu-a com papéis besuntados de álcool e ateou fogo. A certa altura não se contentando em ficar próxima do fogo, tirou o sapato e aproximou o pé das chamas esquecendo completamente que estava calçada com par de meias de fios sintéticos. Dá para imaginar o que aconteceu? Minha irmã pulando igual Saci Pererê com a meia retorcida e queimada grudada na sola do pé.

Voltando ao assunto principal, a Maria. Ao passar por aquela esquina gelada e de ventos uivantes, ela tinha um ritual. Ao atravessar a esquina, bem em frente à loja, ela virava as costas ao vento gelado, torcia o corpo para frente e caminhava. Era como o junco que se dobra ao açoite do vento para não se quebrar. Maria dobrava todo o tronco e puxava a barra do vestido até os joelhos. E assim, completamente curvada para a frente ela engatava a ré e caminhava devagar. 

Sim, ela andava de costas para o vento. E conforme ela andava ela gemia: “Hum, hum, hum...”. O pessoal saía de seus lugares quentinhos só para ver aquela mulher franzina andando pela avenida de costas, de ré, ao contrário. Como diz uma amiga minha "uórever". De vez em quando ela virava o rosto para observar se não havia algum obstáculo a ser desvencilhado.

Assim como o homem de bombachas coloridas, Maria era uma figura folclórica da cidade. Impressionante mesmo foi a Maria no velório. Eu não sei se conto... Será? Conto sim. Daqui a pouco. Aguarde.



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